APUB SINDICATO DOS PROFESSORES DAS INSTITUIÇÕES FEDERAIS DE ENSINO SUPERIOR DA BAHIA

De mãos dadas com a democracia, pela universidade e por direitos

Carreira única para o magistério da rede pública

Por José Albertino Carvalho Lordelo (FACED/UFBA)

A única diferença de salário aceitável entre um professor da educação infantil e o de um professor da universidade federal deveria ser a titulação

Quem se dispuser a investir um pouco de seu tempo para descobrir os salários iniciais ofertados pelos governos estaduais e municipais constatará o que o senso comum já sabe: os governos pagam salários miseráveis aos professores da educação básica. Vejam a tabela abaixo. Ela poderia ser bem mais longa, mas não justificaria porque as variações são pequenas, exceto pelo fato de o plano de carreira do magistério federal fixar um piso em R$ 1.966,00, o que ainda é um salário de miséria. Como atrair um bom aluno da escola média com salários tão baixos que não lhe possibilitarão viver com o mínimo de dignidade, como professor da escola básica? Quem vai querer prestar um vestibular e estudar quatro anos de uma licenciatura e ir morar em Caldeirão Grande, no interior da Bahia, para ganhar R$ 880,00 por mês, ou em Iguaraçu, no Paraná, ou qualquer outra cidade do estado de Alagoas? Qual de nós, professor de uma instituição federal de ensino superior, encorajaria seu filho a ser professor da escola básica no Brasil?

Governo Edital 20h 30h 40h
Estado de Alagoas 2013 R$1.224,00
Estado de Sergipe 2012 R$1.661,00
Estado da Bahia* 2013 R$1.152,00
Santa Mercedes, São Paulo 2014 R$1.821,00
Rodelas, Bahia 2014 R$1.088,00
Crateus, Ceará 2014 R$1.820,00
Iguaraçu, Paraná 2014 R$985,00
São Bernardo do Campo, SP 2014 R$2.402,00
Itatiba, São Paulo 2014 R$2.047,00
Poço Fundo, MG 2014 R$997,00
Caldeirão Grande, Bahia 2014 R$880,00
Igaci, Alagoas 2014 R$ 1.177,00
Rede Federal – EBTT** R$1.966,00
Piso Nacional do Professor da EB de Nível Médio 2014 R$1.697,00

*Processo seletivo simplificado para contratação temporária; **plano de carreira federal

Fonte: editais de concursos em sites de organizações contratadas pelo estado

A Lei do Piso Nacional do Professor da Escola Básica fixa a remuneração mínima para aqueles que têm apenas a formação de nível médio e para 40 horas semanais. Em 2014, este valor é de R$1.697,00. Contudo, os concursos promovidos pela administração pública, por força da Lei de Diretrizes e Bases da Educação, exigem formação superior.  É muito raro um destes editais ofertar  vagas para professores com jornadas de 40 horas. A jornada é, na sua maioria, de 20 horas semanais. Ou seja, regra geral, selecionam-se professores de nível superior para jornadas de meio turno ou de tempo parcial. No outro turno, em que o professor deveria dedicar-se ao planejamento das atividades do dia seguinte – correção de trabalhos, leituras, acompanhamento dos alunos –, ele terá que encontrar em lugares pobres, um meio de complementar sua renda.

Como a tabela demonstra, o vencimento básico de ingresso na educação básica na rede pública é maior no governo federal. Ainda que seu valor seja muito baixo (R$ 1.966,00), alguns imaginam que seria melhor federalizar todo o ensino básico. Não me parece uma solução para o problema. Creio que o melhor caminho é a instituição de uma carreira única para o magistério da rede pública, com vencimentos mais elevados, jornadas de quarenta horas, dedicação exclusiva a uma ou duas escolas, no máximo, e sem qualquer discriminação por nível de ensino. A única diferença de salário aceitável entre um professor da educação infantil e o de uma universidade federal deveria ser a sua titulação. Um professor da educação infantil não pode ter contrato de 20 horas. Enquanto fazemos abaixo-assinados para garantir não mais que oito horas semanais de aulas na graduação, nossos colegas da educação infantil, com formação superior em pedagogia, precisarão dobrar a jornada de 20 horas em salas de aulas, para conseguir um salário que, em alguns casos, só alcançará o piso fixado no plano de carreira docente do governo federal. Imagine um professor de Língua Portuguesa com centenas de redações para corrigir semanalmente ou um de física, matemática ou filosofia, com suas atividades a programar, trabalhos e provas a corrigir, tendo que ocupar um turno do dia com outra atividade não-escolar ou em outra escola, em sala de aula.

Alguns poucos governantes de entes federados mais ricos até poderiam pagar um salário melhor ao professor, mas estes estão impedidos para não ferir a Lei de Responsabilidade Fiscal. Se esta lei não mudar, melhor seria definir as despesas com educação como investimento. Mas, a grande maioria dos gestores estaduais e municipais alega que o pagamento dos professores já consome a maior parcela dos recursos do Fundeb, e qualquer elevação romperia o limite de 60% destinado à remuneração dos profissionais que atuam na educação e sacrificaria outras atividades de manutenção do ensino básico. Há ainda outro problema para os gestores: atrair e manter profissionais nos municípios mais pobres e distantes das metrópoles. Mesmo no ensino superior este tem sido um desafio para os governos. Instituir recompensas materiais por via de taxas de interiorização para estes locais será parte da solução.

A saída, portanto, é aumentar significativamente o orçamento da educação. Algo na linha dos 10% do PIB, como vem sendo discutido no novo PNE, no Congresso Nacional. Mas, este percentual será alcançado progressivamente na década 2014-2024. Minha proposta é um novo e único plano de carreira para todos os professores, da creche ao ensino superior, pactuado já, com aumentos progressivos vinculados aos ganhos da receita dos royalties do petróleo e outras fontes.

E qual deveria ser o piso nacional para o professor que ingressa na carreira do magistério, com formação superior? Aqui é preciso levar em conta que os recursos adicionais que a educação receberá por conta da elevação da participação no PIB será gradual. Considero que o maior problema hoje é o salário de ingresso que afasta os jovens da carreira devido as baixas remunerações. Deste modo, é preciso resolver isto como uma questão de urgência. Como defendo carreira única para o magistério, podemos começar pelo piso nacional da carreira docente das instituições federais, para professores com graduação, 40 horas semanais: R$ 3.804,00, em valores de março de 2014. A este valor, deve ser adicionada a recompensa pela interiorização, de modo a atrair os jovens, como um auxílio moradia, por exemplo.  É preciso ainda fazer uma ressalva: as 40 horas semanais não podem ser integralizadas em salas de aula. Este tempo deve ser dividido em partes iguais entre a sala e o planejamento, acompanhamento de alunos, remediação pedagógica, rotinas decorrentes de processos avaliativos processuais, estudos e formação pós-graduada.

Eis uma bandeira para unificar a luta pela valorização do magistério. Pertencemos a uma única categoria profissional, somos todos professores da rede pública, independente do nível de ensino ou de esfera de governo.